segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Os presidentes das juntas


Eu é que sou o Presidente da Junta, ou melhor, eles é que são os presidentes das juntas, são aos milhares, mais precisamente 4257, tantos quanto o número de Freguesias, mais os secretários e restantes "stafs" dos orgãos de freguesia.
Verdadeiros aprendizes de cacique, esta espécie de interessante observação varia de comportamento conforme a côr partidária pela qual foram eleitos, assim como a região do país onde está a freguesia.
Nas freguesias de província, é a elas que me vou referir, os Presidentes de Junta, muitos deles já com "muitos anos" de vida nestas andanças (alguns desde os anos 70), atravessando todos os (des) governos, de todas as cores, eles próprios multicoloridos ao sabor dos tempos e conforme as tendências da altura de eleição, são a amostra do governo central e as respectivas freguesias mostram em miniatura o estado do país real ao nível governativo.
Representativos das diversas freguesias, estes representantes eleitos pelo povo localmente deveriam, supostamente, representar e esprimir as vontades, desejos, problemas e aspirações dos aglomerados populacionais que representam, mas, ao invés disso, aproveitam-se dos insignificantes cargos de Presidentes de Assembleia de Freguesia para favorecimentos pessoais, favorecimentos de familiares, conhecidos e amigos.
Particularmente interessante é observar os que tentam, e conseguem, fazer vida daquilo, de Presidente de Junta, deixando muitas vezes os seus empregos, para, num gesto de visionários, abraçarem tão nobre profissão.
Apresentam-se aos locais, seus pares, como salvadores, sempre prontos a arregaçar as mangas para "dar uma ajuda" no que fôr preciso, deste assentar tijolo a reparar electrodomésticos, passando pelos tradicionais e fartos petiscos de canes assadas, regados com cerveja á descrição ou vinho da região.
Interessante também é verificar as relações destes "minisócrates" com os restantes poderes locais, Igreja, GNR, Orgãos de Saúde, Bombeiros e, claro está, Câmara Municipal.
Igreja - Em relação ao Prior da Freguesia, se ele não tiver caido em desgraça dos paroquianos, é desde uma palavra de cúmplicidade porque a igreja não é de ignorar na altura dos votos, até ás ajudas monetárias e de mão de obra nas festas locais, tudo conta para cair nas boas graças de Deus, pelo menos até ao primeiro desentendimento pertidário/ideológico/pessoal. O padre é, normalmente, também habitual comensal nos petiscos.
GNR - Relacionamento institucional q.b., não fosse o patrão o mesmo, e geramente o Cabo ou Sargento comandante do posto territorial da zona são outros habituais comensais nas patuscadas de fim-de-semana que muitas vezes são efectuadas nas instalações da própria GNR, é também curioso ver que o parque de viaturas da Junta e respectivos condutores estão imunes a coimas e admoestações por parte da autoridade GNR, concerteza não será coincidência o fenómeno.
Orgãos de Saúde - Devido ao envelhecimento da população local os Presidentes de Junta tentam ter com os médicos de familia locais uma relação próxima, isso dá-lhes junto dos eleitores uma aparência de possivel recorrência em caso de doença e necessidade, a chamada cunha. Talvez por isso os médicos são habituais convivas nas tertúlias gastronómicas e vínicolas que já atrás me referi.
Bombeiros - Com os Bombeiros ninguém se quer dar mal, é politicamente incorrecto
e faz perder votos. O sonho de qualquer Presidente de Junta é ser Chefe de Bombeiros, tinha assim duplo poder junto da população, não sendo bombeiro voluntário "normal" tenta ser bombeiro casual nos ínumeros fogos de verão ou inundações no inverno, disponibilizando os meios das juntas (viaturas e homens) para "ajudar no que fizer falta".
Os Bombeiros também são, muitas vezes, habituais companheiros das almoçaradas e patuscadas.
Câmara Municipal - A relação mais importante é, muitas vezes a mais esquecida, talvez pelo facto dos Presidentes de Câmara não alinharem assiduamente em petiscos, almoçaradas e jantares. Os Presidentes de Câmara são quem efectivamente detêm o poder e as câmaras os recursos monetários que as freguesias necessitam para sobreviver, por isso não podem ser ignorados pelos presidentes de junta, que:
1º - Não sendo da côr partidária da respectiva Câmara Municipal, tentam fazer tudo para denegrir a imagem do respectivo presidente, talvez com a recambolesca ideia e obscuro desejo de ascenderem eles próprios á presidencia da Câmara.
2º - Sendo da côr partidária da respectiva Câmara Minicipal, são os testas de ferro avançados dos caciques autárquicos, tudo fazem para engrandecer e elogiar o nome do presidente.
Resumindo isto tudo temos um factor em comum, os petiscos, almoços e jantares onde todos se encontram, é pois de prever que nesses encontros gastronómicos se decida muito da vida social, politica e económica destes meios populacionais de província, o que diz muito do que por lá se passa, só quem vê é que sabe.
Resta referir a falta dos Presidentes de Câmara nos petiscos, almoçaradas e jantares, é que sendo eleitos pelo povo, cultivam a distância e sabem manter as aparências. A seguir ao presidente de junta, que apenas ambiciona a câmara, o presidente de câmara, cliente partidário, ambiciona o Estado, na forma de administração pública, Assembleia da República ou até mesmo o próprio Governo.